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Paróquia Santuário de Nossa Senhora da Esperança e Santo Inácio de Loyola
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Reflexões quaresmais (I)

Com a quarta feira de cinzas, iniciamos a grande caminhada quaresmal. Cujo objetivo nos conduz, dia a dia, semana após semana, até a celebração da Páscoa do Senhor, Para assumirmos, a continuação, durante cinqüenta dias, a alegria da Páscoa, da Ressurreição e da Vida. E isto, como amostra fundamental do sentido de nossa vida.

Reflexões quaresmais (I)

Escutamos, entre cinzas, a primeira palavra de Jesus no evangelho, que se torna o grito da Igreja: “Convertei-vos e crede no Evangelho”.

As cinzas nos lembram a grande corrente de penitencia (ou conversão) que, desde as origens da história, chega até nossos dias. Situamo-nos, assim, perante aquele antigo alerta: “lembra-te, homem, que és pó e que ao pó voltarás”. Sob o ponto de vista físico, somos isso: poeira cósmica. Sob o ponto de vista humano e teológico somos, ou podemos ser, “Logos” = palavra, isto é, somos o sentido desse cosmos. Pois, pela palavra somos capazes de expressar simbolicamente a realidade que nos rodeia e que nós mesmos somos.  A Palavra (sentido de vida, história e transcendência) do Senhor nos convida a levantarmo-nos sobre esse pó para, mediante a conversão para o Evangelho, assumirmos a Boa-Nova da Vida que nos chega mediante a cruz de Cristo.

Vivemos em “tempo de salvação”. “Deixai-vos reconciliar com Deus”, convida São Paulo. É Jesus crucificado quem nos reconcilia com Deus.

Assumindo a cruz do Senhor, caminhando com Ele sempre, mas especialmente nestes dias, reconciliados com e pelo Deus da vida, nos levantamos sobre aquele pó que somos, acolhendo o novo sopro do Espírito vital de Deus. O barro do qual fora feito Adão (humanidade) e que obteve a vida humana pelo sopro (ruah, espírito) de Deus, é renovado para nós, pela reconciliação de Jesus na cruz. A Vida original do Espírito de Deus volta até nós, com maior força do que nunca na historia humana.

Para chegarmos lá: conversão e evangelho. 

Para termos uma conversão real temos que “rasgar nossos corações e não apenas nossas vestes”, pede-nos o profeta. Entrar em nossa intimidade. Chegar ao profundo do sentido de nossa vida, de nosso “logos”. Discernirmos quem somos no meio de nosso mundo. E aí, como no mito criacional, percebemos facilmente a situação de nossa humanidade, naquele estado de auto-destruição e morte que, teologicamente, denominamos “pecado”.

O que é o pecado? É simples: tudo aquilo que machuca, que corrói, que destrói, que, no fim, mata... os seres humanos, corroendo e destruindo o próprio Espírito de Deus que nos anima e dá vida a todos e que nos reduz a cinzas.

Quando nos fechamos em nós mesmos, nunca conseguimos compreender a imensa extensão do fato teológico do pecado. Sentimos as angustias, as frustrações, a corrosão interna e nossa próprio e paulatino absurdo... Não passamos de sermos apenas pó. Ou poeira cósmica. O fato teológico do pecado em todo seu grande e terrível absurdo é constatável na contemplação do nosso mundo com suas cinzas.

Nos evangelhos Jesus constata várias vezes a possibilidade do sem-sentido de ir parar na “gehena” do fogo, isto é, no lixo da cidade que, arde sem cessar, reduzindo-o a cinzas. O que não falta em nosso mundo é lixo. O consumismo atual está enchendo de lixo a terra, os mares, o ar e até o próprio espaço exterior. O pecado, em sua manifestação global, tem essa conseqüência bíblica: um imenso lixeiro, onde a percepção do humano ou do teológico, do sentido do logos, se crucifica em holocausto que cultua a todo-poderosa economia. Guerras, fomes e pestes continuam pelo mundo afora, em espectrais imagens, mais próprias da Idade Media do que do início do terceiro milênio.  

O Papa Francisco lembra que a economia ou o dinheiro tem que estar a serviço do homem e não este ser transformado em escravo daquela. A boa noticia da parte de Deus, em lábios de Jesus é: “fazei amigos com o dinheiro da iniqüidade”. O dinheiro é sempre da iniquidade, da injustiça. Mas, mesmo assim, encontra sua finalidade, para ser partilhado, para fazer amigos.  É um bom ponto para começo de nossa reflexão quaresmal: para que serve nosso dinheiro? Para contribuirmos a um consumo desenfreado, causa de transformarmos nosso mundo (e a nós mesmos, nele) num imenso lixeiro (numa gehena) destinado a ser cinza ou poeira cósmica? Ou pelo contrário, o transformamos num meio para “fazer amigos”, como nos diz o Senhor, e crescer na experiência da Vida que se encontra na prática da misericórdia, da compaixão, do amor, do perdão, da partilha... Nessas dimensões verdadeiras, humanas e teológicas da vida dos seres humanos, criados â imagem e semelhança do próprio Deus? Considero, finalmente, que o sentido do logos e da vida, a razão de nossa existência é esta: fazer amigos! Em nossos tempos, como aconteceu com Jesus, não é difícil para quem quer ser amigo de todos sem discriminar ninguém, ir a parar numa cruz ou outra...

(Continuaremos com nossas reflexões quaresmais...)


Autor:
Fonte: Pe. Agustin sj
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